Indignação e a fluidez narrativa de Philip Roth

Essa semana eu fui mais uma vez surpreendido pelo talento de um autor norte-americano. Para quem acompanha minhas resenhas no Duofox, deve ter notado que tenho apreço pela literatura da terra do Tio Sam. Sei muito bem que há quem ama e quem odeia escritores que “fabricam” livros dentro de um país que mais parece um celeiro, repleto de livros que parecem jorrar semana após semana, onde Best-selllers revestem prateleiras e parecem dominar a mente dos leitores. Enfim, mas o fato é que o livro dessa semana não parece ter saído de um celeiro, mas sim da alma.

Indignação, de Philip Roth. Posso começar falando que esse livro faz jus ao nome. Terminei a leitura e fiquei indignado. Ainda não havia tido contado com a obra de Roth, o que julgo um tremendo dum atraso literário de minha parte. Para quem ganhou em 1997 um Pulitzer e diversos outros prêmios, algo de especial sua obra deveria possuir, e não tê-lo lido antes foi uma gigantesca bobeira.

O livro conta a história do jovem Marcus Messner, um rapaz judeu, estudioso e que procura sempre ser o melhor em tudo o que faz. No auge de sua adolescência, prestes a entrar para a Universidade, seu pai, um açougueiro tradicional da pacata cidade de Newark, Nova Jersey, começa a desenvolver uma sinistra e doentia obsessão pela vida de Marcus. A relação entre o pai e o filho é bastante explorada ao longo do romance.

Para seu pai, tudo o que o jovem faz ou deixa de fazer parece levá-lo no caminho do mal. Por fazer parte de uma tradicional família judia, Marcus não possui a liberdade que todo jovem gostaria de possuir aos 18 anos.

Narrado em 1ª pessoa, o que torna a narrativa de Roth límpida e fluída, Marcus nos mostra quais seus possíveis destinos para se tornar um jovem “americano” de sucesso em uma sociedade que enfrenta um período histórico conturbado, a guerra da Coréia em 1950. Para um jovem como Messner, os braços do destino são apenas dois. Ir à frente da batalha e morrer como um soldado exemplar, ou estudar para quem sabe garantir seu lugar ao sol. Aplicado nos estudos, resolve optar pela Universidade. Entretanto, o que tinha tudo para se tornar um caminho de aparente paz e sucesso, se torna um complexo e perigoso jogo, onde Messner não poderá sair ileso.

Os conflitos com seu pai e a aparente indiferença de sua mãe, fazem com que Messner opte por cursar direito numa Universidade em Ohio, bem distante de casa. Uma forma de libertação, já que a presença e o comportamento do pai lhe fazem muito mal, e o deixam em uma situação constrangedora e de absurda indignação.

Longe de casa, vivendo dentro da Universidade, Messner travará uma batalha com os colegas de quarto, uns estudiosos demais, outros pervertidos demais. Aprenderá que não se pode mandar no coração, ainda mais quando conhece uma garota por quem se apaixona e pela primeira vez tem um forte desejo sexual.

Os embates dentro dessa história são múltiplos. Philip Roth deixa o leitor realmente indignado por inúmeros motivos. Primeiro, questiona e muito os comportamentos judaicos e o pensamento de jovens que tentam seguir os preceitos do judaísmo numa sociedade em plena ascensão da liberdade de expressão. Segundo, nos fala de como os indivíduos, inseridos em seus “mundos” particulares, não tem a liberdade de agir diferente da massa humana que move o mundo.

Um exemplo disso é uma das passagens do livro, em que Messner vai à sala do diretor da universidade e pede para ser transferido de quarto, pois seu companheiro não o está agradando. O diálogo que tem início é um dos mais perturbadores e interessantes do romance. Onde os personagens versam sobre a crença em Deus, a importância da vida social e a razão pela qual devemos ou não nos socializar. De fato, como o próprio nome sugere, indignação é um romance sobre a juventude e a inexperiência, sobre a tolice e erro. Mas, acima de tudo, uma triste história sobre a vida, onde é impossível sair intocado.

 

 

Felipe Terra Escrito por:

Professor e amante da arte literária, atua na área da educação desde 2011. Viciado na música de Bach, Mozart e Chet Baker, e na literatura de Raymond Chandler, Ross Macdonald e Paul Auster. Ama escrever e acredita que poderia ler mais, porém, precisa dormir, infelizmente. Consegue passar horas jogando pôquer ou xadrez com os amigos. Degustar pizzas de queijo e bacon é um dos passatempos prediletos em horas de fome extrema.

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