A Peste de Albert Camus – Uma pilha de corpos e de metáforas

O que falar de um livro como A Peste? Albert Camus poderia estar aqui agora, olhando para tudo o que os notíciários nos mostra e escrever um A Peste parte II. Corpos, autoridades confusas e silenciosas, uns tentando ajudar, outros burlando o sistema. Esse é o retrato que o argelino Camus constrói.

A narrativa ecoa e se multiplica como os ratos que assolam a cidade ceifando almas. As vidas que perambulam pelos capítulos são uma mistura de aceitação e incredulidade.

O livro é uma obra de arte. Um amplo debate reflexivo sobre a condição humana e o absurdo. Sim, o absurdo na obra de Camus se faz presente aqui assim como em O Estrangeiro.

Entretanto, o absurdo aqui tem o odor fétido, empilha corpos e nos faz pensar no quanto um sistema falho pode colocar uma cidade ou um país à beira do colapso.

ruas desertas
A primeira coisa que a peste trouxe à cidade foi o exílio. Ruas silenciosas, desertas e o cheiro de morte tornava tudo mais assombroso ainda. Pessoas desapareciam e ratos emergiam nas calçadas.

A narrativa nos apresenta um certo narrador que conta a história de uma pequena cidade, Oran, um lugarejo na costa da Argélia. O texto todo nasce após um dos personagens tropeçar em um rato morto. Um rato que gera todo o drama de uma cidade e que aprisiona pessoas por conta de uma doença, a peste.

Os personagens que desfilam por entre as linhas de Camus são médicos, jornalistas e pessoas comuns, são vocês, sou eu, somos todos nós. A visão pessimista e a atemporalidade desse livro assombra quem lê.

Um livro mais que necessário 

A cada virada de página um novo questionamento surge. Como um livro de 1947 parece descrever o Brasil e o mundo de 2021? Por que as autoridades no livro aparentam agir com uma vagarosidade inconsequente? Por que tudo o que Camus colocou e abordou nesse livro supera as expectativas?

Nesse romance temos uma metáfora atrás da outra. Referências premonitórias que se sobrepõem. Se o leitor busca um livro com uma construção altamente refinada, vai encontrá-lo em A Peste, com certeza.

Muitos dizem que essa não é a melhor obra do autor, mas baseado nos textos de Camus que me caíram nas mãos nos últimos anos posso afirmar que sim. Dá para ombrear com O Estrangeiro.

Por fim, algo para pensar durante a leitura. Ler Camus é ler a essência do ser humano. Ler a A Peste é ler a absurda essência do ser humano em meio a um mundo onde milhares de mortes, e o desejo de revolta, andam de mãos dadas.

Isso te lembra alguma coisa? Se sim, nem tudo está perdido, e isso é ótimo.

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Felipe Terra Escrito por:

Professor e amante da arte literária, atua na área da educação desde 2011. Viciado na música de Bach, Mozart e Chet Baker, e na literatura de Raymond Chandler, Ross Macdonald e Paul Auster. Ama escrever e acredita que poderia ler mais, porém, precisa dormir, infelizmente. Consegue passar horas jogando pôquer ou xadrez com os amigos. Degustar pizzas de queijo e bacon é um dos passatempos prediletos em horas de fome extrema.

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