O interior do Brasil em Torto Arado de Itamar Vieira Junior

Dia destes, me invoquei a ler o Torto Arado de Itamar Vieira Junior, aclamado por tantas pessoas como um dos livros de 2020, que por sinal venceu dois prêmios: Jabuti e Oceanos. O Romance começa muito bem, e já pega o leitor nas primeiras páginas.

A história das duas irmãs Bibiana e Besolinia se passa em Água Negra, povoado do interior da Bahia, uma cidade fictícia que tem tudo o que é de real em nossas vidas: servidão, patriarcado, a exploração, a fome, a seca, as relações de poder, as ameaças e a violência. Uma história triste que fala sobre a paixão de uma lâmina reluzente de um facão, que marca o destino de duas irmãs neste povoado, repleto de mazelas, mas também de alegrias e ritos.

Da vivência em casas de barros repletas de precariedade, da luta por melhores condições e habitações, rodam os ciclos de histórias contadas por Belonísia, Bibiana, Salu, Zeca Chapéu Grande e outros personagens que nos encantam, a cada ensinamento através da simplicidade, humildade e respeito com a terra e suas divindades.

“Meu pai, quando encontrava um problema na roça, se deitava sobre a terra com o ouvido voltado para seu interior, para decidir o que usar, o que fazer, onde avançar, onde recuar. Como um médico à procura do coração.”

Retrata também o trabalho infantil na fazenda, a ausência de remuneração pelo trabalho, a obrigatoriedade de comprar mantimentos na venda do dono da fazenda, o trabalho de domingo a domingo e a dificuldade de se aposentar.

“Que para aposentar era uma humilhação, pedir documento de imposto ou da terra para os donos da fazenda. Os homens se amarravam para entregar alguma coisa, além de explorar o trabalho sem pagamento dos que iam se aposentar. Às vezes chegava o dia de ir para a Previdência e o povo não havia conseguido reunir os documentos de que precisava.”

Um grande clássico para ser colocado ao lado de Vidas Secas, São BernardoMaleita, Fogo Morto e tantos outros romances que abordam sobre a vida no campo com tanta veracidade. Boa leitura!!!

Diego Fernandes Escrito por:

Bebedor desenfreado de café, Diego é desenvolvedor front-end e professor. É o fundador do Duofox. Na literatura não vive sem os russos Tolstói, Dostoiévski e Anton Tchekhov e consegue "perder" tempo com autores da terra do Tio Sam, Raymond Chandler e Melville. Acredita que a arte de maneira geral é a única forma de manter o ser humano pelo menos acordado, longe do limbo que pode levar a humanidade à Encruzilhada das Almas.

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